Ao tratarmos o tema do perdão dentro do dinamismo da vida cristã, precisamos reconhecer que não é fácil perdoar, porém, não é impossível, mas, extremamente necessário. Quando tomamos consciência da força destrutiva do ressentimento, das mágoas, dos rancores, enfim, de todos os maus sentimentos que norteiam os relacionamentos feridos e mal resolvidos, passamos a entender que tal resolução [perdão], tendo por referência essencial o amor de Deus e não a ferida, não é opcional para os que anseiam o céu, mas uma condição primordial de salvação.
A Sagrada Escritura é composto de vários textos que tratam sobre a importância do perdão: “Pois, se perdoardes aos homens os seus delitos, também o vosso Pai celeste vos perdoará; más se não perdoardes aos homens, o vosso Pai também não perdoará os vossos delitos” (Mt. 6, 14). Segundo o expressar desse texto bíblico, não perdoar significa perder o perdão de Deus, ou seja, apartar-se da Misericórdia Divina.
Tendo em vista que perdoar significa não guardar mais o mal, quem não perdoa faz comunhão com as trevas, com o mal. E como somos chamados a viver em comunhão com a bondade, e o valor da nossa eleição está na contínua abertura ao amor, tocar nesses sentimentos mal resolvidos é uma necessidade da alma! Pois, a história da humanidade demostra claramente que a resposta da vida é fruto do que reina no coração. Diante de tal questionamento, respondamos: O que tem reinado no meu íntimo?
O ressentido é refém dos acontecimentos, da história ferida, dos seus “vitimalismos” e razões altamente justificadas. O segredo da liberdade e da vida na graça de Deus é ver e rever a ferida no amor, no Amado de nossas almas, pois somente nessa perspectiva a cura do coração será total.
Agir contrariamente a essa verdade significa pôr em jogo a própria salvação, porque o Reino dos céus é para os misericordiosos. É a ordem do amor que coloca a vida na dinâmica das bem-aventuranças: “Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia” (Mt 5, 7). Ou seja, uma operação concreta de perdão nos relacionamentos rompe definitivamente com as trevas dos maus sentimentos.
No livro do Eclesiástico encontramos um forte exemplo de como devemos nos comprometer com a verdade salvífica do perdão: “Perdoa ao teu próximo o mal que te fez, e teus pecados serão perdoados quando o pedires. Um homem guarda rancor contra outro homem, e pede a Deus a sua cura! Não tem misericórdia para com o seu semelhante, e roga o perdão dos seus pecados! Ele, que é apenas carne, guarda rancor, e pede a Deus que lhe seja propício! Quem, então, lhe conseguirá o perdão de seus pecados? Lembra-te do teu fim, e põe termo às tuas inimizades…” (Eclo 28, 2-6).
É muito cruel pensarmos que as inimizades não resolvidas nesta vida terrena nos levarão à eterna inimizade com Deus, isto é, ao inferno. Sofrer com tais sentimentos nesta vida e ainda por cima sofrer eternamente pela falta de decisão no amor e no perdão é muito entristecedor!
A conversão pelas vias do perdão é o caminho da alegria, da vida de Deus, de um trilhar santificante, libertador e salvífico! Um interior saudável e revelador de eternidade é o resultado desse processo íntimo de conversão e reconciliação, na força do amor e do perdão. Contrariamente a esse processo, constatamos facilmente o fruto colhido na vida daqueles que não decidiram pela misericórdia, permitindo então o reinado dos maus sentimentos: desânimo, tristeza, amargura, frustração, angústia, negativismo, murmuração, revolta, raiva, ira, impulso autodestrutivo, vingança, egoísmo, autopiedade, entre outros. Por isso, olhemos para o nosso íntimo e tomemos a decisão que nos reconcilia com Deus e os irmãos, decidamo-nos pelo céu, pelo amor e pelo perdão! Sigamos o conselho do livro do Eclesiástico: “[…] Lembra-te do teu fim, e põe fim às tuas inimizades…” (Eclo 28, 6a).
Padre Eliano Luiz Gonçalves, sjs. (Fraternidade Jesus Salvador).
Fonte: Canção Nova