Eucaristia a serviço da paz. Por Dom Luiz Antônio Cipolini

Amados Irmãos e Irmãs

“Este é o sangue da aliança que o Senhor fez conosco…” (Êx 24,8). Estas palavras do Êxodo fazem referência à história do povo de Israel, que Deus fez sair do Egito, da condição de escravidão, e durante quarenta anos guiou no deserto rumo à terra prometida. No monte Sinai o povo libertado entrou em aliança com Deus. Deus resolve com soberana liberdade conceder a sua aliança, o seu pacto ao povo de Israel e dita as suas condições. Deus escolheu o povo de Israel por pura gratuidade, sem méritos da sua parte porque o ama e quer manter o juramento feito a seus pais. Deus cumulará o povo com suas bênçãos e lhe garantirá a vida e a paz.

Ao conceder a sua aliança ao povo de Israel e ao fazer-lhe promessas, Deus também lhe impõe condições a serem observadas fielmente. Moisés expôs tudo que o Senhor lhe havia prescrito. Então todo o povo respondeu: “Faremos tudo o que o Senhor Deus disse e lhe obedeceremos” (Êx 24,7). O povo fez um solene compromisso; e honrá-lo condicionará para sempre a sua caminhada histórica. O povo de Deus está numa encruzilhada: se obedece, garante para si as bênçãos divinas, se renega a aliança, condena-se ele próprio às maldições. A aliança consiste em voltar ao essencial, à experiência da dependência total de Deus, quando a sobrevivência estava confiada nas suas mãos, para que o mundo compreendesse que “não só de pão vive o homem, mas de tudo o que sai da boca de Deus” (Dt 8,3). Assim também acontece conosco, Deus nos escolhe para si, sem merecimento algum de nossa parte. Será que temos consciência desta escolha? Será que procuramos viver na sua presença?

Uma vez selado este pacto, esta aliança, Moisés levanta marcos de pedra para as doze tribos e um altar. Oferece sacrifícios e derrama uma parte do sangue sobre o altar e com a outra parte do sangue asperge o povo, para assinalar a união que se estabelece entre Deus e o povo de Israel. Os profetas põem na aliança uma carga de conotações afetivas. O povo é o rebanho, Deus é o pastor. O povo é a vinha, Deus é o vinhateiro. O povo é o filho, Deus é o Pai. O povo é a esposa, Deus é o esposo. Essas imagens fazem a aliança aparecer como um caso de amor prévio e gratuito de Deus, pedindo em troca um amor que se traduza em obediência. Deus cumpriu as suas promessas, mas a infidelidade do seu povo atraiu sobre si os castigos previstos. Porém, apesar da infidelidade do povo, o plano de aliança querido por Deus continua a existir inalterado. Haverá, portanto, no fim dos tempos, uma nova aliança. Assim se realizará o programa outrora traçado: “Vós sereis o meu povo e eu serei o vosso Deus” (Êx 36,28; 37,27; Jr 31,33; 32,28).

Em Jesus se cumpre a promessa. Depois de ter tomado o pão, Jesus o distribuiu dizendo “Tomai e comei, isto é o meu corpo”, em seguida toma o cálice de vinho, o abençoa e o faz circular dizendo; “Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que será derramado por uma multidão” (Mc 14,24). A distribuição do cálice é um gesto ritual. As palavras pronunciadas o associam com o ato que Jesus está para realizar: a sua morte livremente aceita para a salvação da multidão. O vinho lembra que a aliança do Sinai havia sido feita no sangue (Êx 24,8); os sacrifícios de animais são substituídos por um sacrifício novo, cujo sangue realiza eficazmente uma união definitiva entre Deus e a humanidade. Graças ao sangue de Jesus os corações humanos serão transformados e o Espírito de Deus será dado. E uma vez que esse ato será doravante tornado presente, em um gesto ritual que Jesus manda fazer em sua memória, é pela participação eucarística feita com fé que os fiéis estarão unidos de modo mais íntimo ao mistério da nova aliança e lucrarão das suas graças.

Na nova aliança os pecados são perdoados, Deus habita entre os homens; transforma os seus corações e põe neles o seu Espírito. Portanto já não é a aliança da letra, mas a do Espírito (2Cor 3,6), que traz consigo a liberdade dos filhos de Deus. Ela abarca todas as nações, não apenas o povo de Israel, pois o sangue de Cristo refez a unidade do gênero humano. Jesus fundou a nova aliança: pelo sacrifício de seu corpo entregue e do seu sangue derramado ele fez da humanidade o seu Corpo. A vida inteira de Jesus foi de doação ao próximo, sem excluir ninguém. Com Cristo, cada cristão deve dizer, cada dia: “Eis meu corpo…Eis meu sangue…” Esta é a nova aliança. Esta foi a atitude de Dom Oscar Romero, morto no sacrifício da missa. Portanto podemos afirmar que quem age desse modo derrama o próprio sangue pelos irmãos, colabora com Cristo na destruição do pecado e participa da criação de uma nova humanidade.

Há, por outro lado, também aqueles que enriquecem explorando o trabalho dos outros. Estes não derramam o próprio sangue, mas o dos outros. O Papa Francisco, na sua bula de proclamação do jubileu extraordinário da misericórdia, se expressa assim: “O meu convite à conversão dirige-se, com insistência ainda maior, àquelas pessoas que estão longe da graça de Deus pela conduta de vida…. O mesmo convite chegue também às pessoas defensoras ou cúmplices de corrupção. Esta praga apodrecida da sociedade é um pecado grave que brada aos céus, porque mina as próprias bases da vida pessoal e social. A corrupção impede de olhar para o futuro com esperança, porque, com sua prepotência e avidez, destrói os projetos dos fracos e esmaga os mais pobres” (MV, 19). Hoje, cada um de nós pode perguntar-se: e eu? Como vivo a aliança com Deus? Deixo Deus guiar os meus passos?

Daqui a pouco, durante a procissão, seguiremos Jesus realmente presente na Eucaristia. Na Eucaristia comunica-se o amor do Senhor por nós: um amor tão grandioso que nos nutre com Ele mesmo; um amor gratuito, sempre à disposição de cada pessoa faminta e necessitada de regenerar suas próprias forças. Viver a experiência da aliança significa deixar-se alimentar pelo Senhor e construir a própria existência não sobre os bens materiais, mas sobre a realidade que não perece; os dons de Deus, a sua Palavra, o seu Corpo e a sua Paz.

Assim seja!

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